Técnico da seleção japonesa WKF de Karatê afirma: Karatê é para vencermos a nós mesmos.
02/05/2010 23:19Em matéria de karatê, a hierarquia é coisa para se levar muito a sério. É tudo uma questão de respeito, palavra que Kanazawa, o Kancho (quer dizer, precisamente, o "líder", o "topo") evoca em cada idéia que transmite. Para ele, o karate é essencialmente isso. E é "harmonia entre todas as pessoas", é "muito bom para a saúde, para o espírito e para o corpo". Quando começou a treinar era diferente: "Nessa altura, eu ainda não pensava no karate como um meio de moldar o meu caráter, era apenas para lutar", confessa, ao Expresso, o homem mais graduado do mundo (10.º Dan).
Depois, o karate aconteceu-lhe e tornou-se tudo. "É a minha vida". Viaja por todo o mundo (já conheceu mais de 90 países), passa oito meses por ano fora do Japão. A Portugal, vem desde 1990, com o filho mais velho, Nobuaki Kanazawa (6.º Dan). Gosta da cultura partilhada entre os países, do "espírito e carácter semelhante". Gosta de Portugal como gosta do Hawai, de Hong Kong, da Irlanda e da Eslovénia, os seus "países preferidos".
Kanazawa é muito mais que a graduação que carrega. É uma lenda em movimento com seguidores em todo o mundo - a SKIF (Shotokan Karate-Do International Federation), instituição que criou e à qual preside, reúne mais de três milhões de praticantes distribuídos por 120 países. Quando era pequeno, sonhava ser piloto ou general. Queria ser "diferente". E conseguiu. Kanazawa faz uma vénia e sorri.
Na sede da Federação Portuguesa de Karate Shotokan(FPKS), que promove a vinda do japonês ao nosso país, pede desculpa pelo inglês que fala não ser perfeito. Dentro do dojo (o local onde se pratica karate) não precisa de mais: é o corpo dele quem fala. Imitam-lhe os movimentos - os dele e os de Nobuaki, sucessor de Kanazawa para o título de Kancho. Os movimentos perfeitos, milimetricamente desenhados, robotizados, os movimentos (que pensávamos) irrealizáveis.
"É tudo uma questão de treino", garante o único aluno vivo de Gichin Funakoshi (o "pai do karate moderno"), a poucos dias de completar
79 anos. "Treinava de manhã, antes de ir para a escola. E à tarde, depois da escola. E à noite". Treinava todos os dias ("no day off") e quando chegava a casa treinava mais: "Quando chegava a hora de descansar, continuava a treinar na minha cabeça, imaginava os movimentos e desenhava-os".
A mão partida
Japão, 20 de Outubro de 1957. Chegara o grande dia, o do primeiro campeonato nacional de Kanazawa. Nas vésperas, partira a mão e
m quatro sítios. "Não vou poder combater, parti a mão", disse à mãe, que o surpreendeu com uma visita. "Não sabia que fazias karate só com a mão direita", respondeu-lhe. Kanazawa percebeu a mens
agem. Entrou no campeonato com a mão direita ("A minha melhor mão") partida. Foi o único dia em que pediu ajuda a Deus ("Faz-me ganhar") e Kanazawa acredita que "alguma coisa" lhe aconteceu: "Os movimentos do adversário pareciam em câmara lenta, era como se pudesse ler a mente dele", lembra. A mão esquerda defendeu, a direita ficou parada, os pontos foram todos com os pés. Ganhou todos os combates. "Ajudou-Me tanto que nunca mais Lhe pedi nada".
Mais do que a medalha de ouro que ganhou, o camp
eonato fez Kanazawa perceber que "todo o corpo é uma arma", conta-nos, mais de 50 anos depois do "grande dia" (no ano seguinte, voltou a subir ao pódio na modalidade de combate, e, pela primeira vez, conseguiu o primeiro lugar na modalidade "kata").
"O karate é ganharmos a nós mesmos", diz Kanazawa. E essa filosofia, esse "espírito Budo", é que abala a teoria de quem vê o karate como uma me
ra actividade física: "O desporto é um jogo, é vencer o adversário. O Budo é diferente".
fonte: Karate das Meninas
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